Em sessão, Faouaz pede reflexão sobre massacres e cenário de intolerância

Em sessão, Faouaz pede reflexão sobre massacres e cenário de intolerância

Na sessão ordinária desta terça-feira (19), o presidente da Câmara de Jundiaí, Faouaz Taha, pediu pausa nos trabalhos para apelar a uma reflexão diante dos massacres recentes ocorridos em Suzano, no Brasil, e em duas mesquitas da Nova Zelândia.

Faouaz reforçou, em seu discurso, a necessidade de não encontrarmos um único culpado e trabalharmos para uma sociedade menos intolerante que a cada dia reforça hábitos violentos, tanto na política quanto na sociedade.

Muçulmano, ele ainda frisou que se solidarizaria com uma tragédia ocorrida em quaisquer ambientes religiosos, pedindo assim menos preconceito entre as religiões e paz entre as diferenças. "Essas tragédias são de todos nós", disse.

A Casa ainda fez um minuto de silêncio em solidariedade ao momento, antes do início do expediente.

Confira o discurso na íntegra:

 "Peço a licença de todos para fazer uma pausa e um pedido de reflexão na sessão desta noite.

Na última semana, passamos por tragédias que nos deixam dores e tristeza marcantes, profundas e devastadoras: os massacres ocorridos na Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano, e em duas Mesquitas da Nova Zelândia.

Na Holanda, houve um ataque a tiros em um bonde, com três mortos.

Para além da maldade desses assassinatos, de atos de homens voltados a seus semelhantes, vimos o desabamento de uma escola na Nigéria; vítimas de um ciclone em Moçambique e no Malawi, e um início de ano de tragédias no País, como o crime em Brumadinho e tanto sofrimento.

Peço, portanto, que possamos refletir juntos e de forma verdadeira sobre o momento em que vivemos. Apelo à atenção de todos.

Porque não tratamos, infelizmente, somente da dor imensurável dos familiares, daqueles que perdem seus pais, filhos, entes queridos – a quem humildemente e com toda solidariedade dedico esta sessão – tratamos também da nossa dor profunda de sermos parte desta realidade atual, da intolerância que ganha cada dia mais força, da ausência do olhar sobre nós mesmos e sobre nossos próximos, da empatia que nos falta e tanto precisamos.

Sofremos do nosso próprio mal em não nos ouvirmos e acharmos que ganharemos no grito, na força, nas armas. Nossa violência cada dia se manifesta das formas mais inimagináveis e, ao mesmo tempo, cotidianas, porque não lidamos com as frustrações, projetamos vidas perfeitas, não nos damos as mãos, não nos esforçamos por nós mesmos como um todo, não valorizamos os degraus.

Diminuímos nossas forças, nossas diferenças, nos fechamos, nos isolamos, queremos sempre ganhar sozinhos.

Somos todos seres humanos e não cabe agora encontrar um único culpado que justifique essas tragédias, que nos isente da sociedade cruel e doentia em que vivemos e que infelizmente ajudamos a criar.

Não cabe, porque como bem disse meu amigo e professor da ESEF, Afonso Antônio Machado, em sua coluna, não há um único culpado. Somos vítimas e algozes dessa situação, desse mundo com tantas feridas.

Certamente temos que discutir as diversas nuances do bullying, a influência de jogos violentos, dos entusiastas do armamento, os impactos da intolerância religiosa, do racismo e dos preconceitos que infelizmente ainda nos matam, nos emperram em um mundo doente.

Mas também temos que discutir o quanto somos parte disso. Temos que nos colocar no lugar do outro, nos ampararmos. Faço mais uma referência ao professor Afonso que tão bem disse: o quanto um comportamento machista, uma palavra mal colocada, uma observação grosseira num grupo de pessoas, podem gerar vazios existenciais brutais que certamente podem não acabar bem.

Enquanto somente nos provocarmos, não nos aceitarmos e não refletirmos sobre nossas diferenças, não entenderemos nossas mudanças e novos espaços e estaremos, como sociedade de um modo geral, fadados a muita incompreensão e violência.

Digo isso também aos presentes e colegas vereadores. Quantas vezes vimos clima de ódio nesta Casa e me questiono o sentido real desse confronto. Será que não seria mais válido ouvirmos nossas razões, buscarmos a conversa e o diálogo?

Temos sim que avançar em muito na política, mas na sociedade como um todo. Temos que repensar leis que nos protejam, como fazem agora na Nova Zelândia com a reforma necessária na lei de armas, após o ocorrido. Porém, temos que olhar ao redor e mudar esse cenário também no nosso dia a dia, não só cobrar, e sim agir e participar.

Como muitos sabem aqui, sou muçulmano, e me solidarizo a essa tragédia nas Mesquitas da mesma forma que lamentaria mortes em uma sinagoga, em uma igreja evangélica, em uma igreja católica, em um centro espírita ou templos de matriz africana. Não podemos, diante do ocorrido, cair novamente nos preconceitos e julgamentos que nos isolam.

Bem disse uma muçulmana, em um texto da internet, que a beleza de toda essa tragédia é o mundo poder saber das portas abertas da nossa casa, do quanto uma Mesquita acolhe quem nela adentrar e do quanto aqueles que morreram em oração não perderam ali a sua fé, pelo contrário.

Temos a chance, de a partir dessa tragédia tão dolorosa, aprendermos justamente com a fé. Porque podemos nos aproximar, levar flores aos sobreviventes, aos familiares desses sobreviventes, às Mesquitas e igrejas de todo mundo, a todos que só querem ter o direito de ser como são.

No Alcorão, temos a passagem que diz 'o Servo de Deus não alcança a realidade da fé até que ele ame para as pessoas o que ele ama para si mesmo da bondade.'

Com essa citação, gostaria de encerrar esse pedido e apelo para que sejamos diferentes, para que possamos aprender com nossos erros e sermos sempre melhores."

Recomendados para você